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banksy.co.uk
"nenhuma estação é lenta quando te acrescentas na desordem"
eu lembro de uma tarde, ele se soltou um pouco, fez meia dúzia de piadas e uma dancinha com as mãos. sem perceber, já tinha reprimido. havia uma mesa nos separando sem crueldade. teu maior riso é tão pouco. e eu ainda não sei pra onde olhar.
já escrevi tantas vezes
"evitar a ironia
e o tango, sobretudo o tango,"
o vestido preto com véu e sem fenda
que visto e me emboto a tecer eu,
tua prenda,
a luz tão branca do que é mudo
e quando chega a noite, exausta tiro
o que da boca foi parar na lapela,
a flor vermelha murcha
largada em cima da mesa
cansada de ser rosa
**
reler memorial de aires
deixas o verão deslizar de mansinho
para o cobre luminoso do outono e
às primeiras chuvadas recomeças a escrever
como se em ti fertilizasses uma terra generosa
cansada de pousio – uma terra
necessitada de águas de sons de afectos para
intensificar o esplendor do teu firmamento
(al berto)
O céu descoberto para vê-los passar. Se olharmos de cima, além da cabeça retraída, vamos ver a tensão no ombro que vem desde o meio do peito, porque carrega um dilúvio que nunca aconteceu, nem nuvem se formou, como se o tempo tivesse ficado tão sem água, tão sem chuva, que, de tão seco que ficou, cristalizou-se. Ela também tem uma forma cristalina, mas não rochosa como a dele, para ela só não existe fora ou dentro. Ela passa num mundo sem gravidade em que o sol poente não precisa de nada para ir. O leitor mais desconfiado com ele se parecerá. O mais impreciso, com ela. Mas e se ambos, na verdade forem um só? Em meio a tantas adversidades é necessário narrá-los.
eu era um avião dando voltas em berlim. com o punho encoberto no dourado, carregava um gerânio talhado em cada asa. nesses parafusos da alta-costura me escondia, o espadachim vestido de lataria, eu firmava a grande patente do céu, azul e doido, demais.
deixando em paz a germânia, voando em círculos, vivendo, como quem vindo se desfaz para trás, aeronave foi rompendo, reluzindo para cima. nem se via lá debaixo, quanto de mim partia. na cabine a conversa dum construtor com o meu pai. descubro que sou assim, tão sem dona de mim, nessa minha falta de cais.
a janela da cabine forçando, que não era de tais alturas, os botões convulsionando, não sei mais arranjar estrutura. e o painel do radar estoura. nesse caco o co-piloto perde a glote e eu aeronava, subindo, subindo o terror das aeromoças
enfim.
No sonho ela está numa paradisíaca Ilha, chão de conchas brancas, aguazinha cor de piscina. Onde ela se conheceu com ele. Quando olha para o lado, está num posto de gasolina shell Amarelo e Vermelho. Blue, like monday evening, está o coração dela. Ela quer amar e para isso não precisa amarrar os sapatos brancos. Mas alguma coisa que falta. Entra na loja de conveniência, conversa com o cara do balcão. Trata-se da recepção do jornal do país. Pelas paredes de vidro blindex ela olha lá fora. O azulzinho vem do vidro e se remete para a água. Parece que começou a chover. “Pensei que tivesse entrado pra comprar uns cigarros”.
-Cigarros? eu tenho muitos. Quer?- diz a outra pelos ombros dela.- Eu vou até ali em cima pegar. Quer?
Ela pensa que a outra pelo menos deve ter notícias do outro e escolhe ficar junto dela. A outra sobe as escadas e ela sobe também. Não se lembra dos cigarros e não sabe se subiu pelas notícias. Ela não repara que está indo atrás da outra que abre uma porta de madeira clara e entra pra um outro compartimento. “Ali eu não posso ir," ela pensa e senta na frente de um Ibook. Espera, espera olhando o descanso de tela. A outra sai de uma porta e por trás d’Ela atravessa a sala retangular, entrando em outra porta. A outra
repete a mesma passagem por trás d’Ela algumas vezes. Como os homens da família, hoje ela está de camisa e procura pelo maço no bolso. Ainda sem. E decide levantar. De repente uma nublação na cabeça. Não lembra mais se ela subiu porque a outra deixou. A outra parece atravessar a sala com olhares cada vez mais persecutórios. De repente “não era para eu estar aqui”, de repente desconhecida, “de repente a outra me reconhece”. Não salta da janela, filha minha, encontra a porta de saída descendo a escada, vira a maçaneta com tranqüilidade. O porteiro nem te olha. “Vou ter que explicar para o outro o que eu vim fazer aqui?” e atravessa a rua, as lagoas sumiram, não se volte para o mar, e ele há de voltar, vai lá, continue nessa, assim, street walking cheetah, with a heart full of napalm