13.9.06

leiam o que caetano escreveu para nós. eu que era um homem rude virei toda atenção e, não sabendo como dizer exatamente que o texto dele me: _____, escrita com a vantagem da liberdade, só quero mesmo é aqui postar:

para júlia
partindo desses momentos de hoje, eu me lembro, ao viés, daqueles dias em que comecei a entender que meu corpo disputaria comigo os movimentos da velocidade, para me trazer, eu que olhava bobo e de lábio mole admirando os fubás, uns sinais mais íntimos de que o desempenho dos trajetos também seria terra e vermelho adentro na perna, ou uma parede mais dura quando todo o ritmo de ar diria nuvens, poeira, ou amarelo. a paisagem em que esse pequeno salamaleque se envolvia em cheiros e ramos se misturava com as boas feições de minha avó, que na época, ainda longe de atingir um canto de plantas molhadas, melodias e balanço, se decidia com os sorrisos doces e leves a guardar só com o amor, por um tempo cedido, os netos no sítio. nessa época, além de minha figura, também estava minha prima, um início de j, a seduzir a realidade com aquele ar irônico que a fez criar mais tarde, só para si, um quarto escuro de palavras, todo tecidos e luzes. em boa parte desse tempo nossa avó, apropriada a mim e à pequena saltimbanca, ia desviando os cantos óbvios das horas para envolver-nos quase numa atmosfera única da qual os outros enventuais parentes, vultos de conjunções e interjeições cinzas, não poderiam tomar parte. o poema começava a descer das árvores, e seria mesmo ela ou a gente, vagabundinhos, a dar a medida rodopiante de um conhecimento crescente e outro dos corpos, nossos próprios e pequenos corpos sendo de vidro, folha e areia? nem não interessa assuntar muito nisso; o certo é que foi naquele tempo que principiei a escrever com gotas de chuva, papel e palavra só aprenderia a usar muito depois, a mesma época em que minha prima já recitava os poemas de suas melhores invenções: me vêem nítidas agora as imagens de uma dobra variando cor em sua calça, os pássaros verdes que ela matava e fazia reviver com um franzido na testa, o sol parado entre a concha de suas mãos, e o pulo grande que atirava sua esperteza no corrente da água. lembro também que sentia muito medo à noite, pois me ______todo, o amarelo e o quente, não entendia mesmo como o fluxo ainda numa hora já tão séria em que nos despedíamos do mundo sob as ordens carinhosas de avó. ah, e acho que foi depois de um dia, em que a malandrinha me surpreendeu tentando caminhos secos entre os lençóis, que compreendi a exata importância de ocupar o espaço, de caminhar pelo corpo dentro de um tempo tão fictício. a disputa necessária entre eu e aquele outro que há em mim pôde então derramar traços e letras, essa minha prima sabia mesmo das coisas, e o poema adquiriu a fúria e a leveza do peixe fosforecente. ela sabia dos rios, como muito tempo depois, através mesmo do esquecimento que se interpusera entre nós, eu a voltei a ouvir dizer, no acaso da aparição do amor entre uns amores muito meus. agora sei porque, ao ver meu desespero naquela noite, ela deitou-me a paz de não temer, ela que, sempre ao voltar para casa, retornando de nossas férias, ia uma em direção as alturas dando a mão aos pais e outra, terrosa, vermelha, ardente, em direção ao nosso reino, deixando cair pelo caminho as sementinhas dos vários romãs donde ela retirava a tinta de sua proeza, a coleção mais doce dessa infância que volta a atravessar.

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