Mais um dia. É muito difícil segmentar os domingos: eles são longas tardes ou longas manhãs, por vezes longos crepúsculos. E isso torna ainda mais penoso o meu estado. Não poder sequer esperar pela tarde, entremear com uma expectativa qualquer o sofrimento que me condena a um presente sem remissão. E pensar que sempre tive problemas com continuidades.
Em meus tempos de escola reinava uma sábia hierarquia. Aprendíamos a escrever a lápis e somente depois passávamos aos exercícios com canetas esferográficas. Após todo esse treino podíamos então escrever a tinta. De início a aspereza do papel consumia o lápis, aos poucos conquistávamos o direito de sulcá-lo, para ao fim ganhar-lhe a trama. Mas há algo aprendido nos tempos de colégio que me marcou ainda mais profundamente. A partir de certo grau, era-nos ensinado escrever as palavras sem fazer remendos. Deveríamos escrevê-las sem suspender o movimento do lápis, deixando para o fim os traços que não pudessem ser feitos ao longo desse movimento uniforme. Só depois seriam cortados os tt, postos os acentos etc. Jamais pude conquistar pessoalmente essa disciplina. Sempre precisei simular acontecimentos futuros que contivessem promessas de deleite ou surpresa. Para gente como eu os domingos são terríveis.
trecho de "Aventura", d' O filantropo, de Rodrigo Naves.
5.3.06
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2 comentários:
Eu também jamais consegui escrever em movimento contínuo... acho que a maioria...
ah, os domingos. não os levemos a sério, é melhor.
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