30.11.09

o creme é mais amarelo

no tempo que não havia tempo eu não esperava, adentrava. depois que os anos começaram a passar depressa um mês, dois, três, nada. em certa altura não sei se eu conquisto o tempo como um avançador marinheiro num azul noturno guiada por sei lá qual estrela ou se é o tempo que me vence como a barriga do seu dragão. no caso da estrela, ela me dá sorte, quer dizer, luz que sorteia.




escrever e pensar: o caminho que é livrar-me numa nova estrutura.



sonho em Portugal é bola de Berlim.

24.11.09

o livro do ano



ham-ham
pelo menos do meu ano, o livro
agora dá pra baixar em pdf o

cantos de estima
full edition sem cortes e remasterizado
clica aqui e mergulha

vento

qual o teu terror?
conta de me levar
se abro a janela.

23.11.09

carinho



agora, no 12 exemplares pode-se ver a maior parte das respostas dos participantes do projeto.
logo serão todas.

**

acho que é
intuição

metade de mim sempre já sabe das coisas antes
e a outra metade é crítica demais pra aceitar que já sabe
ou fica lá dizendo tá vendo tá vendo tá vendo
mas a metade que já sabe tem mais calma e ternura
pode até se dispor a humildade de não saber
mas a parte crítica também salva a que acha-que-sabe
de cair nos crocodilos e de voar com as borboletas
(borboletas morrem em três dias)
e é na reiteração de uma sobre a outra que vivo
ou na sombra de uma alegria guerreira
que cresce feito árvore

agora o que se vê é a copa no outono
mas está é mesmo crescendo raízes pro fundo
(lá é úmido e tem mais minerais)
daí às vezes sobem coisas pelos veios
(são os arrotos das árvores)
que brotam maçãzinhas pêras amoras
depende do desejo

**

intuição acho que é
como ir ao cinema sem saber que filme vai passar
e estar disposta a ver o filme que for passar

20.11.09

Não tenho paz nem posso fazer guerra
temo e espero, e do ardor ao gelo passo,
e vôo para o céu, e desço à terra
e nada aperto, e a todo o mundo abraço.

Prisão que nem se fecha ou descerra,
nem me retém nem solta o laço;
entre livre e submissa essa alma erra,
nem é morto nem vivo o corpo lasso.

Vejo sem olhos, grito sem ter voz;
e sonho perecer e ajuda imploro;
a mim odeio e a outrem amo após.

Sustento-me de dor e rindo choro;
a morte como a vida enfim deploro:
e neste estado sou, Dama, por vós.



Petrarca em tradução de Jamil Almansur Haddad.

19.11.09

céu

Trocaram as fontes sem sequer eu visse
olho pra cima e me atravessa o tráfego
luzes vermelhas se meus olhos se fecham são cor de flamingo e
os pássaros voam com a autoridade
que passeio pelo príncipe real
vendo vencidos nos bancos
pela pobreza, o amor, a um livro.

#

Eu tenho um beijo preso na garganta.
O mundo deu uma volta e o poema não está pronto.
Fico tão noturna quando é de tarde.

#

Passeio em mim como quem viajasse de trem
e é sempre amanhã que chegamos.

#

Espero a hora de dizer: o jeito que te vejo entrando em mim
como um cavalo derrubando as paredes pelas escadarias.

#

O mar guardado em tuas gavetas.

17.11.09

confidenciação

esse é pro B

tamô seguro usando meia.

16.11.09

s/títuloainda

as milhares de horas de vídeos
gravadas pelos japoneses
nesse minuto viajando no mundo
as câmeras guardadas em Lisboa
chove como se abrissem um lençol
e tentassem arrastar as colinas pro rio
enquanto desenhas
linhas de um mar apavorado
mas grande demais pra fugir.

14.11.09

amor

se quem puder ser for o que será?

*

um modo de cruzar os braços sobre minhas cinturas foi daí o conforto e nem percebes que eu entro pela sala pensando em deitar sobre você escondido numa cadeira de braços altos e todo trançado no próprio corpo entendo que hoje à noite eu sou de ninguém e o modo como diz duas vezes a mesma coisa a segunda com maior dura entonação e a palavra dura menos e é pra se fazer rir ninguém vê graça eu vejo.

*

agora estamos na praia.
como já disse
não quero que morra
em mim a admirável criança

embora ande com um desejo de envelhecer pra me aproximar
fazendo o elogio da retidão
então descubro que a serenidade é um sinal de declínio

13.11.09

talvez você não acredite

como eu evito
mas pra escrever o "cantos de estima"
tive que morrer muito

memória

vontade de ver neve sobre um mar
eu simplesmente ouvi a luz do vento

antónio franco alexandre

cujo nome por si só, já é o meu poema.

cumprir um destino

essa é a 4a casa em que vivo
mas se pensar bem,
em quantos carvalhos já me enrodilhei?
penso justamente em janeiros na bahia
como essa vida quente me define
de ter feito casca
virei a casaca
poucas coisas trouxe
mas não deixei o meu edredon rosa queimado
que me enrolava nas noites de ayahuasca
e agora me esquenta as cólicas e o pavor noturno
pavor noturno de evitar o pavor
clicando
a nova mensagem
tenho medo de abrir
e de ler dizer amor.

*

eu quero um livro de capa branca
depois um livro rosa ferrugem
toda essa meditação
consumiu as horas de leitura
porque eu estava a sonhar
com o futuro de um livro
que ainda não escrevi

*
ficar comigo

*
.

12.11.09

hoje eu vi o marcos

lá na casa da mamãe e do papai

11.11.09

está decretado que voltei a sonhar

*

faço desse blogue também de sonhos um diário.

*

essa noite sonhei que eu estava no sam's club de osasco com a minha mãe e o meu pai me dava um travesseiro novo. era a maior felicidade do mundo, eu abraçava o travesseiro. daí a gente saía de lá e pegava a av. escola politécnica e aquilo ia me dando uma angústia, uma angústia. eu pensava "quero estar em Lisboa". e sentia saudades, assim, violentíssimas. e a angústia virava ansiedade e eu começava a calcular "o que vai ser preciso fazer pra estar em Lisboa de novo?" e era impossível. então senti tanta angústia ao lado do córrego Pirajussara que acordei! abri os olhos já era de manhã cedo pensei "caraleo, onde é que eu sou?", vi minha máquina de escrever, "cacete onde é que eu estou? em que ano, que lugar, que direção?" e a luz de outono entrando nas paredes descascadas desse quarto me disse "ai foi só um sonho ruim" e vi que até onde não sei, continuo querendo estar aqui.

10.11.09

maturação

essa noite sonhei que tentava revisitar a parte da minha casa sempre não aproveitada que só existia em sonhos que eu tinha que havia um sótão onde eu nunca ia e sempre que nele chegava (creio que já escrevi sobre isso) havia a impressão de um desaproveitamento. então hoje sonhei que eu levava algumas pessoas pra conhecerem esse lugar (eram todas minhas desconhecidadas) e o lugar tinha virado uma biblioteca. de repente um rapaz, muito solícito, levava lá pra cima uma televisão. eu ficava bravíssima com ele. e dizia "não é necessário", ao mesmo tempo que tentava esconder minha ira das visitas e, por conta desse gesto, eu o perdoava um pouco.

saíamos de lá e eu estava sozinha com um pé de amora. não tinha nenhuma amora madura mesmo. e toda vez que eu pegava uma elas se enfiavam espinhos muito duros no meu dedo. apareceram umas mulheres e tiravam as amoras que ali tinham e comiam. uma delas olhou pra mim e me disse "essas são boas de um modo diferente". e eu disse "mas então há frutos verdes que se comem?". espetava o dedo, mastigava que diferente!, e era bom.

9.11.09

você tem um canyon escondido?

sabe como é, uma terra que se abre em duas e entre elas voam uns pássaros e nascem umas coisas.
o rio se dizia logo

axolote

vou comprar chocolate
nem tou sozinha
vou alimentá-lo.
eu fui pra Patagônia pequeninha.

a Patagônia cabia num grão-de-arroz.

eu hoje comprei uma Vespa.

e uma dúzia de chaves-de-fenda.

vou montar a minha cadeira vermelha.

que herói que se preza além da capa e da máquina de escrever encarnada tem a world famous cadeira vermelha de 14 euros do ikea.
o dormente morava dentro do rio e o rio se dizia lago olho bem fundo de boiar em marrom no centro da água meu ver de terra redor redor em cavei um umbigo pelo qual eu mirava você era a discordância de nuvem você na ausência até que é isso o que era você era eu e não me bastava a história de sempre da solidão apaixonada da paixão pelo vento que esfria/ a paixão e /ferve a vontade de deitar sobre mim, coração.

*

não me eram suficientes os dígitos, a música, a salvação.

eu queria morrer, dizer-te pulando de rua não desafie meu super-herói interior, que ele derruba montra/vitrine não fica nunca abandonado, meu coração é tão povoado!, vem meu bem, ver a vila que eu fiz em você.

*

depois me contaram que o modo de perder um homem era dizer "vem cá" puxei as cobertas e me virei pra lá.

*

tem gente que bebe.
de dentro da xícara de café esperava-se um líquido veio que não vou sugerir a quebra de linha e voou do bule fervente o som de uma asa de gaivota se abrindo era uma criatura que em mim renascia de dizer criatura como se ainda acreditasse em monstros indefiníveis eu que vim de criança sendo uma imaginação tantas vezes soterrada tantas vezes reles tantas vezes dormente tantas vozes

8.11.09

é melhor deflagrar a guerra do que
prender a respiração pra sempre

*911

-alou, AFOGUEI

5.11.09

uma crônica que me aconteceu mesmo ontem e eu resolvi anotar

eu aqui também moro em frente dum supermercado. e é importante dizer "super" porque se não em Portugal "mercado" é o que no Brasil se chama de "feira". pois então, fazia uma semana que eu não ia ao super. estava com as costas doendo e mal humorada. cheia de tristeza, de saudade, de dúvida e medo. e, principalmente, de saco cheio de tantos afazeres domésticos que, pensava eu, me emperravam o desejo de ir ao cinema, estudar, começar uma nova pesquisa na biblioteca, sei lá, andar até um miradouro qualquer e olhar o Tejo indo pro mar. mas fui lá, leite, ovos, espinafre, arroz, essas coisas. evitei o chocolate que sabia que melhoria meu humor, mas depois? é um respeito. que vontade de comer goiaba.

tava meditando que de novo comprava o trident tropical mix já no caixa quando um senhor de uns 90 anos se aproximou vindo da rua de bengala, naquele ritmo de passo a passo, vestido de fato xadrex em marrom, velocidade de 1/4 de metro por minuto e falou baixinho com o caixa, que nem pra ele olhou. carregava uma nota fiscal e uma embalagem de chocolate em pó fechada. passaram as minhas coisas na frente dele, os códigos de barra apitando e o senhor cabisbaixo esperando. quando terminaram com aquilo tudo o senhor finalmente se aproximou do menino do caixa e disse o que lhe acontecia

que ele ao chegar em casa conferindo a nota tinha percebido que aquele pacote de chocolate não tinha sido pago e que ele estava lá pra resolver isso. o gajo do caixa se enrijesceu todo daquela demonstração e muito duro sem nem olhar pra idade do homem nem nada passou o chocolate no apitador de barras e disse

-são 89 céntimos.

o senhor abriu o moedeiro com as mãos tremendo e moeda a moeda pagou. eu me retirei para casa enquanto a compra se finalizava. pensei? não. só me doí.

**
o que é que me doeu?


****.

1.11.09

espero que novembro amanheça bem

nenhuma esperança é feita de si/ tudo está para sempre acabado / redigo: que me queiram mal.

se todo o desvio é em si caminho, labuto na divergência: escrevo.

não mais.
não mais.
não mais.

e sobretudo no ato de escrever é que digo: escrevo.
e tomaste a minha pena a minha voz e agora a minha compreensão.

admiro muito minhas calças cor de camelo.

comprime o ritual nessa falta de mim.

e nunca estive tão só.

creio que poderia atirar-me ao rio e ir parar no Brasil.

se assim o fizesse, não seria feliz. mas que importa a felicidade?

é como um monte de musgo que um cavalo pisa indiferente se aquilo fosse bosta.

e eu tento falar contigo como outros falariam mas não consigo e tento te convencer como convenceria a outros e não consigo e me vejo mais uma vez na mesma cena de sempre só que dessa vez estás vestido de azul enquanto antes preferias o cinza, amor.

quem é que me vaga e vagueia?

não sinto nada, mamãe.

descubro à meia-noite de ontem que não te quero mais.

descubro é: meia-noite, és um gênio, e não tens um botão de play/ stop.

pela sabedoria não posso te odiar, nem chamar a ti de boneco de gelo.

se me perguntassem o que aconteceu eu responderia com "e azul". não diria outra coisa, não direi. podem dizer que vivo meu avesso. podem dizer que esperam das passagens das ruas coisas melhores pra mim e pra você, porque em fato tem todos medo de encarar a vida como ela é. o tempo.

no entanto, tu, encaras. e eu te olho como a um mamute num zoológico onde todos enlouqueceram achando que são macacos cheios de depressão no cu.

descubro-te rindo da crueza e com crueldade das coisas como ela são. odeio-te?

gostaria de gostar da idéia de levar minha mão na tua cara num tapa.

não sei o quanto silêncio há num sol escancarado. e quanto acreditar que as palavras vencem um corpo. ao meu elas sempre venceram. estou mais uma vez só com elas.

será essa a minha sina para sempre, estar comigo e com as palavras e te juro, que não me lamento, nem arrependo e nem gostaria que fosse diferente.

gostava de voltar a essa sinceridade mais vezes.

mas por hora me calo, espero o inverno passar.

não sei se a nossa nobreza nos consola ou piora. afinal, não somos deuses.

talvez se deuses fossemos poderia eu sublimar em criar estrelas.

mas, no fim, até posso. faço versos: cartas de adeus que dizem: fico mais um enquanto.
 

Free Blog Counter