30.4.08

estou com dificuldade de escrever por aqui. talvez uma enorme de escrever em todos os lugares. e como esfriou e até as moscas das bananas da cozinha sumiram, coloco um trecho da história do antonio, que continua e logo, em poucos dias, vou ter terminado a primeira parte. sem contexto, nem nada, só o trecho, para acabar com essa lenga de exposição:

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ouvindo múm, finally we are no one e o qualquer coisa, do caetano.
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Procurava por um cheiro que me fosse familiar, um vislumbre, qualquer coisa antiga que se apresentasse para além dos meus passados mentais, mas só encontrava cortinas abafando a rua, novos armários que guardavam coisas de outros, janelas cerradas. As vagas lembranças do tempo que passei na casa enquanto Asaboli ali vivia pareciam devastações próximas da irrealidade, planos desérticos, um grande oceano onde antes havia uma cidade.

Uma palpitação me atravessava ao tocar a campainha e quando, finalmente, entrava na casa, me sentia levitando entre os móveis, em um estado de alerta meio desconcentrado, numa forma do sobreaviso, como se Asaboli pudesse aparecer a qualquer momento e nada mais no mundo merecesse minha atenção. E o ritmo de Flora era tão mais marcado conforme o tempo passava, que eu ia me centrando aos poucos nos gestos da sua delicada violência. Era claro que ela detestava a convivência consigo e passava tanto tempo tentando se domar, que a entrada de um outro em seu espaço era uma intromissão nas suas tentativaS concentradas. Feito um animal territorial, no começo da aula, antes de se sentar ao piano, Flora me tratava de um jeito dúbio em me trazer dúvidas de se eu tinha feito certo ao vir mais uma vez e ainda sem pagar. Calava recolhida, sentada era um ralo, um buraco negro que sugava para seu modo de estar todas as formas de ser do mundo.

Fazia inverno ao redor dela. Como poucas casas conseguem no Rio de Janeiro, essa tinha a propriedade de guardar durante o ano todo um frio de tempos antigos. Quando me levantava para pegar um copo de água, da cozinha até o canto da sala onde estudávamos, entre um cômodo e outro eu sentia correntes do ar se locomovendo frio e meu corpo tomado por arrepios, me comovia. Os móveis duravam limpos por dias, o tempo corria lentamente dentro da casa e parecia que Flora não envelheceria nunca, porque já havia nascido velha, com seu ar de dama antiga, o perfil todo agudo, vestindo sempre alguma malhazinha ou um lenço no pescoço, com o rosto cansado como se o frio aumentasse enquanto dormia.

Era decisivo o momento em que sentava no piano e, movimentando as mãos pontiagudas, aos poucos se abria rejuvenescendo, virando uma dessas adoráveis mulheres que falam por todos os lados, voltando a sorrir de histórias do tempo recente de quando era menina, Porto Alegre antes, não esse Rio de Janeiro intratável. Havia bicicletas, um sonho de estudar literatura, dificuldade em se expressar, alguma coisa que se rompeu bruscamente, uma cena de nudismo na beira de um rio anônimo. Um dia me deixou claro que não havia estudado música formalmente nunca, mas como tinha talento pensava em transmiti-lo para alguém que pudesse fazer alguma coisa com ele. Ela, não. Ela deveria pintar.

26.4.08



Lucas, sus intrapolaciones

En una película documental y yugoslava se ve cómo el instinto del pulpo hembra entra en juego para proteger por todos los medios a sus huevos, y entre otras medidas de defensa organiza su propio camuflaje amontonando algas y disimulándose tras ellas para no ser atacada por las murenas durante los dos meses que dura la incubación.

Como todo el mundo, Lucas contempla antropomórficamente las imágenes: el pulpo decide protegerse, busca las algas, las dispone frente a su refugio, se esconde. Pero todo eso (que en una primera tentativa de explicación igualmente antropomórfica fue llamado instinto a falta de mejor cosa) sucede fuera de toda conciencia, de todo conocimiento por rudimentario que pueda ser. Si por su parte Lucas hace el esfuerzo de asistir también como desde fuera, ¿qué le queda? Un mecanismo, tan ajeno a las posibilidades de su empatia como el moverse de los pistones en los émbolos o el resbalar de un líquido por un plano inclinado.

Considerablemente deprimido, Lucas se dice que a esas alturas lo único que cabe es una especie de intrapolación: también esto, lo que está pensando en este momento, es un mecanismo que su conciencia cree comprender y controlar, también esto es un antropomorfismo aplicado ingenuamente al hombre.

"No somos nada", piensa Lucas por él y por el pulpo.

(para Eva,
afinal da onde vieram os polvos?)

nenhuma surpresa invade o passado?
o livro todo do Cortázar aqui

23.4.08

ilana_ soft coeur, temporal diz:
No décimo andar de um prédio da Av. Faria Lima, a minha professora francesa ficou murmurando alguma coisa incompreensível do tipo "il bruge, il bruge". Eu só pensei que ela estava sendo indelicada com a aluna que fazia sua exposição oral, segui prestando atenção na menina e lamentando meu nível de francês.

júlia_ dificilitando amor one-way contramçao diz:
Eu e meu pai estávamos no bairro de Pinheiros conversando a respeito do belo novo livro que saiu sobre a Clarice Lispector quando minha mãe telefonou de Sorocaba dizendo que a terra tinha tremido. Meu pai disse pra ela que devia ser tontura de algo que ela comeu no almoço.


22.4.08

it's over

Caro(a) aluno(a), favor comparacer (sic) junto a seção de alunos para
assinatura da ata de
colação de grau, das 9hs às 11h30 ou das 17hs às 20h30,
Grato,

--
Atenciosamente,
Seção de Alunos de Graduação - Letras




cersibon é um rimbadu g~enio entre nós

20.4.08

20.11.2007
meu desejo mesmo era ir parar dentro do meu imaginário

e acessível sempre que conquistei em mim, conquistei finalmente e esses dias, caetano, a certeza de uma intuição lírica e desesperada e confiante na palavra, mesmo que seja uma outra palavra, ou uma palavra ausente.

20.11.2007 (à noite)

mas não é sempre mesmo um ninguém repetido que anseia? "ela segue, a si mesma, ela se segue". eu entendo a casa, a minha que é dela, vivo dentro da casa e conheço a cidade, com meus próprios olhos e o estômago seco que não me deixa mentir. talvez por isso eu ainda não esteja na boa de ouvir sozinha os barulhos da chuva na calha solta. meu silêncio -raro é a única coisa que me diz que estou em casa. de resto, mesmo que murmure, por enqüanto, estou escancarada. e se eu gritar, isso não vai atravessar o muro.

18.4.08

quando eu era criança o mundo todo fazia silêncio. tentava caminhar entre as coisas evitando o toque com elas, palmilhando o chão como se tivesse os pés recobertos por uma camada úmida de veludo. olhava para tudo que não fosse gente, os bichos, os objetos de arte e não conseguia entender porque eles não diziam. hoje ainda fico muito comovida quando penso entendê-los em movimento e ação. mas, na época, quantas vezes acordava sobressaltada?, quando um objeto de madeira rangia, a televisão estalava ou um animal chiava longe e me levantava bruscamente sozinha, as costas do colchão, tentando entender o que aquilo expressava tão esporadicamente em meio a tanto silêncio.
eu sentia também uma espécie de inveja daqueles insetinhos que voam em volta das bananas. porque eles giram sem zumbir, têm uma aparência de insignificantes e voam tão lento, duram tão pouco, que para eles o limiar entre a vida e a morte é tão fino que eles me pareciam livres dessa responsabilidade.
uma vez meus pais estavam na europa. me escondi atrás da poltrona verde-marinho do apartamento da minha vó, encostadas as cortinas que amarelavam. procuraram por mim durante algum tempo, até que sai do meu esconderijo quando a sala ficou vazia, porque não agüentava mais segurar os espirros que o pó me obrigava. depois de um tempo contei para a minha vó, queria a confidência, mas ela me repreendeu dizendo que a irmã dela usava marcapasso e poderia ter se assustado. essa irmã morreu mês passado.
comecei a escrever tudo isso porque tenho me pegado muito tímida, assim como quando era criança.hoje isso me agrada porque timidez em mim se confunde com calma e estranhamento. mas um capítulo sobre o contrário do silêncio, também sempre por mim praticado, ainda não sei dizer. talvez a fala fale por si própria. ou talvez um dia eu alcance, sabe lá se a fala ou o silêncio, de uma planta.

16.4.08



(um folk sobre o movimento)
Deleuze: "Se você está preso no sonho de outro, está perdido".
- -

15.4.08

é o mesmo dilema com outra roupagem: como libertar as palavras do jorro e também do crivo? talvez em um salto, alto. acredito também na coragem e no capacete de motociclista, esquecido, pendurado no parapeito do vizinho. tenho que estar pronta, repito, com o meu punhado de revolta e descontrole combinados à minha parcimônia de delicadezas e ressalvas, tudo misturado na minha capacidade de sussurro. "eu sou um menino bravo com a menina que sou." hoje nós compramos flores na dra. arnaldo e um mapa da europa na papelaria aviação, para servir de tabuleiro de war.

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"Exigir da força que não se expresse como força, que não seja um querer-dominar, um querer-vencer, um querer-subjugar, uma sede de inimigos, resistências e triunfos, é tão absurdo quanto exigir da fraqueza que se expresse com força." Nietzesche na Genealogia da Moral

::: : : :: :

As passagens eram as palavras e o calçamento as frases. Antes de mim havia o mundo. E depois de nós não havia nada. A cidade era outra e os caminhos de sempre, onde estavam? Chega uma hora que as ruas da nossa infância começam a ter limites. Às vezes os ultrapassamos e quando chegamos do outro lado esquecemos tudo de cara. Demoram um tempo para se recuperarem, os caminhos, mais um tanto para serem bonitos, naturais e completos de instintos, um ruído combinado com um cheiro lembra a foto, depois a cena completa e, um choro mais claro traz um mapa aos olhos e logo estamos passeando como se andássemos pela memória, em seus territórios.

:::

8.4.08

esperanças são retráteis

estou lendo O Passado do Alan Pauls. tenho tantos comentários a fazer, que por enquanto só quero dizer que se terminá-lo (contra minha mania enorme de trocar de livro pela metade) me prometo que vou escrever sobre demoradamente. (talvez faça uma comparação maluca entre ele e o Indecisão do Benjamin Kunkel.) não sei. (fazia tempo que não tinha vontade de escrever sobre literatura.) (também fiquei sem abrir parênteses durante uma fase). (e fazia mais tempo ainda que não destacava um cartão reproduzindo algum quadro do edward hopper para usar de marcador de página.) tenho afeto.

além disso, depois de passar pelo blogue do marcos querido, correspondente e articulista fui cair numa vontade de ler a hilda hilst (também por causa de uma conversa mais comprida com ela). quando olhei na estante, fiquei surpresa, que depois do machado, do drummond e da lispector, é a autora brasileira de quem tenho mais livros. entretanto, não tenho o hábito de lê-la, nem nunca tive, mas fui ganhando seus livros, pegando emprestado, e hoje eles se avolumam por aqui. muito raramente, como hoje, abro. raro não porque a despreze como quem a ignora, mas talvez porque a língua se misture com a fala de um jeito que me perverte. existem livros que me alteram a visão, a percepção, o pensamento e outros, como o Júbilo Memória e Noviciado da Paixão, a dicção. gosto do modo como ela constrói a paixão e o amor inteiro e multifacetado. fico levemente preponderada a ser raptada pela tua anta e volto a escrever o que mais gosto, poemas dos quais duvido. logo me recupero.

i.

não tenho nem
do amor, da vida
o conhecimento
que desperte o largo contentamento

amor tão mesquinho é amor,
amado?
e se nos espelhos imantados
te curvas na minha direção
e não respondes,
devo supor que não me vês?

ii.

(Can you now return to from where you came?
Try to burn, your changing name? - nick drake)

e se o fogo que corre na horizontal,
queimando trigo ramos aos milhares
begônias presas em luares
e alcança o pasto das ninféias
na linha onde o sol se põe
o fogo boiando sobre a água
atravessa os limites da cidade
e engolido pela minha garganta
atinge a força inescrupulosa
na ponta do meu dedo indicador
e, como conheces meu peso,
levantas de mim gemendo
pelos corpos atravessados
em lençóis de hotel, avisos, pústulas
num gesto, tudo em vão,
feito um sopro,
ao fogo!
contente mercador
de avisos, partidas, silêncios

6.4.08


1984

(gosto do cinto combinando com o sapato e do gesto receptivo da minha mãe
gosto da praticidade do meu pai, o relógio que nunca tira,
gosto muito das plantas, da escada no fundo com a gaiola do passarinho em cima
gosto de como tem um quê cômico nisso tudo

no mais, minha cabecinha parecia um cone, sei lá, a testona de um velho careca
muito velho velho velho olhando inside)
 

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